domingo, 26 de maio de 2013

A integração do espaço público. As Bicicletas e a Mobilidade Urbana no Rio de Janeiro: Caminho para todos.

Este é um texto que escrevi para a Ong "A Partir do Rio", a pedido do Leonardo Alves de Lima. Compartilhem e opinem. Para nós é muito importante.
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 A integração do espaço público

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 As Bicicletas e a Mobilidade Urbana no Rio de Janeiro
Caminho para todos.

Viver nesse mundo sempre foi se movimentar de um lugar a outro,   mais ainda desde que o mundo é “urbe”. Ora, a urbe acabou se tornando sinônimo de  deslocamento, da mesma forma, nem sempre trânsito foi sinônimo de carro ou pior ainda, de engarrafamento. De forma que mobilidade hoje é o termo que urge à urbe para uma forma de fazer a vida transitar e torná-la mais fluida. Assim sendo, Mobilidade vai lidar com o direito de todos por um espaço adequado às necessidades biológicas, sociais e econômicas da sociedade, da mesma forma, também abordará a justiça, já que em termos de direitos nem todo grupo social tem tido o mesmo uso-fruto da possibilidade do livre transitar, ou pelo menos não de maneira de igualdade de direitos. Na verdade, o trânsito tem se tornado cada vez mais na urbe, espaço de exclusão.

Temos sofrido muito com a falta de mobilidade sustentável. Por exemplo, a demora que um trabalhador leva no trajeto: casa-trabalho x trabalho-casa não é computado em termos de jornada de trabalho. É sabido que a forma como é feita a mobilidade extenua sua condição de produtividade e qualidade de vida. E mais, a violência no trânsito e do trânsito tem se tornado algo comum. Não se trata só do deslocamento de veículos em desacordo às normas de trânsito que promove violência. Não me refiro somente a isto, o que está além é a própria falta de mobilidade como geradora violência. Na verdade, a falta de mobilidade é em si uma das várias formas de violência urbana. Isso porque se ao mesmo tempo em que um ciclista é atropelado por um carro ou ônibus por um dos dois não haver respeitado o direito de compartilhar uma via, também é bem verdade que enquanto o trânsito se mantém estático gera frustrações e sentimentos de angústia e revolta, somadas a toda sorte de conflitos pessoais acumulados durante a semana. Um simples buzinar pode ser um indício/início de agressividade. No trânsito parado as pessoas se olham de formas fechadas, competitivas e não raramente apáticas. Henry Ford costumava dizer que um mercado nunca fica saturado de bons produtos. A quantidade de carros em uma via e a maneira de vivermos hoje revela que essa máxima não é verdadeira.

Para que tenhamos uma mobilidade urbana viva e sustentável precisamos ter a capacidade de integrar e diversificar os modais de transporte. Além disso, é mais que necessário diversificar e aumentar o número de centros de desenvolvimento para que uma quantidade grande de moradores de municípios adjacentes não precisem ir trabalhar tão longe de suas casas.

Dentro deste cenário e realidade há um modal de transporte que tem e terá fundamental importância na mudança de mobilidade e na fluidez e liberdade de trânsito da cidade, promovendo mais identificação com a cidade e qualidade de vida. Refiro-me às bicicletas. Estas que desde há tanto tempo atrás eram veículos de transporte, mas ao passar dos anos e mudanças culturais, sociais e econômicas se tornaram meros instrumentos de lazer domingueiros.

Quebrar o paradigma carioca de que bicicleta é puramente um objeto de lazer se faz necessário cada vez mais. No entanto, em meio a isso é comum se ouvir que “lugar de ciclista é na ciclovia”, ou pior ainda “lugar de ciclista é na calçada”. Ora, quando se convencionou que os veículos motores, particularmente os carros, são os donos da rua? Os destinatários de um processo de construção de mobilidade são pessoas, independente de como escolheram transitar. A rua e a cidade devem ser para pessoas e não para coisas. Quando se convencionou que os veículos motores, particularmente os carros, seriam a melhor forma de se conduzir e detentores únicos e privilegiados do direito de ir e vir? Simples, quando transitamos levamos conosco pra qualquer lugar que seja nossos valores e conjunto de crenças a partir da cosmovisão que nos move. O inconsciente coletivo que quando cristalizado se torna estático para as nossas vidas e não permite pensar diferente maneiras, alternativas à rotina nos impossibilitam de mudar. Na maioria das vezes quando se vive todos os dias indo e vindo em coletivos lotados o que vem a mente do cidadão é “quando eu comprar um carro isso vai acabar”. Desmistificar o status da carapaça metálica que blinda o ser humano em seu automóvel de seu poder e ego e individualismo é necessário.

É bom que se diga que as bicicletas têm seus direitos e devem compartilhar a rua e que apesar de que ciclovias são feitas para bicicletas, as bicicletas não são feitas para ciclovias, mas sim para gerar possibilidades de trânsito. E apesar de ser um senso comum que ciclovias são necessárias para uma melhor mobilidade urbana é importante afirmar que ciclovias não são sinônimos de “paz no trânsito” nem a solução da mobilidade urbana, mas sim parte dela.

A lei protege o menor, a partir do senso de responsabilidade do maior dando oportunidade de todos dividirem e compartilharem o mesmo espaço. É observado que tem crescido a quantidade de ciclistas na cidade do Rio de Janeiro. Nos últimos oito anos houve um aumento de 84,3% do uso deste modal. Mais de 1,2 milhão de viagens de bicicleta por dia, o que representa 5% de todos os deslocamentos na cidade, segundo a ONG Transporte Ativo. Isto é bom. E mais ainda, estudos feitos no EUA revelaram que o carro já não é mais tão atraente para o jovem de lá. Creio que isso será uma tendência aqui também. Talvez já esteja sendo.

A bicicleta talvez seja a máquina mais multiuso que o homem já inventou. Certamente uma das mais importantes. Resgatar o senso de multiplicidade da bicicleta, a mesma que foi responsável por permitir ampliar a nossa variedade genética ao deslocar nossos antepassados de lugares para lugares em romances até então impensados e inesperados, socializar, trabalhar, até a possibilidade de gerar energia elétrica. Ela é um veículo que transpassa a cidade e imaginar cidades, nos termos de mobilidade urbana está implícito o apreciar o lugar que está passando bem a sua frente.

Uma experiência marcante tem sido as “bicicletadas” (Massa Crítica), toda última sexta-feira do mês. Estas são intervenções no trânsito em que vários ciclistas de várias partes da cidade se encontram e saem para pedalar coletivamente para assim ocupar o espaço das vias de trânsito mostrando que a bicicleta é um veículo de transporte. Os grupos agem em rede como Bike Anjo (voluntários que se encarregam de conduzir iniciantes da bicicleta ao trabalho), a bicicletada Jardinária, a Nuvem Sound System, e A Cyclofônica também são outras manifestações.  Há dois anos eu nunca imaginava que havia um movimento no Rio de Janeiro, a partir de bicicletas e seus amantes e entusiastas pedalantes, nem imaginava o tanto como as bicicletas poderiam oferecer a mim e a cidade.

A bicicleta leva-nos além do trânsito e do lugar, nos liberta. Sem bicicletas futuramente não haverá trânsito (no sentido correto da palavra, que é deslocar-se de um lugar a outro). Espaços de vida devem ser vivificados. A função social e biológica, e assim sendo, ecológica de todo espaço é permitir a vida. Sem trânsito não há vida.


Jorge Tonnera Jr.
Biólogo especialista em Gestão Ambiental, trabalha como Professor de Educação Ambiental na Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro – COMLURB; é membro do Coletivo Igrejas Ecocidadãs – RJ, e participa de massas críticas (Bicicletadas). Escreve no seu blog “Essa Novidade de Vida”.
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